A produção vinícola da Serra veio com os imigrantes italianos, em 1875, mas são poucas as vinícolas centenárias, como a Salton, que permanecem na mesma família. Neste ano, a empresa do distrito de Tuiuty, de Bento Gonçalves, alcançou a marca de 110 anos. Comandada pela quarta geração, a Salton comemora mais uma década em momento histórico para o setor.
Ao mesmo tempo que a safra de 2020 é considerada de qualidade excepcional e a pandemia ampliou o consumo de vinhos brasileiros, a vinícola, que vem investindo em exportações e no enoturismo, também precisou reavaliar o cenário.
Daniel Salton, 66 anos, presidente do Conselho de Administração, integrante da terceira geração no comando da vinícola, já conduziu processos de reinvenção na companhia e destaca, a seguir, um pouco da história e dos planos da Salton para os próximos brindes.
A Salton está completando 110 anos e dobrou de tamanho na última década. Apesar de levar o sobrenome Salton, como iniciou tua história nesta empresa centenária?
Desde rapaz, com uns 16 anos, eu ajudava a pesar as uvas na vinícola. Prestei vestibular para administração na PUC, passei e me formei. Então comecei a trabalhar na empresa em agosto de 1980. Em 1981, foi feita uma verdadeira revolução na empresa, e assumi um cargo na direção. Assumi um posto mais voltado ao financeiro e, pouco a pouco, me inteirei de assuntos relacionados a custos e à área administrativa, até me tornar responsável também pela área comercial. O Conhaque Presidente nos deu fôlego para todas as ações que seguiriam. Nós tínhamos pouquíssimos vinhos na época, lançamos vermute, uísque, vodka, mas o que restou daquela época foram os sucos de uva e os espumantes. Nossa condição de venda era focada em atacado, distribuidor e varejo. Não existia isso de restaurante. Nosso foco era volume, em produzir. O meu conceito sempre foi voltado ao planejamento: o que vamos precisar fazer ano que vem? Que uva vamos precisar? Em 1998, nos atentamos em lançar produtos com a marca Salton. O que engrenou foi o Salton Classic, um varietal que era vendido a R$ 9,90 nos mercados. Na época, os vinhos estavam nessa faixa, mas as grandes vinícolas da cidade vendiam com preço mais caro. Então, acertamos o gosto e o bolso do público. E foi na virada do século, de 1999 para 2000, que nos demos conta de que a empresa poderia ser uma grande produtora de espumantes, que o espumante ia cair no gosto das pessoas. Miramos então nossos investimentos.
Outro motivo para comemorar é o aumento das vendas dos produtos nacionais na pandemia. Como está o desempenho da Salton?
Favorável, sem dúvidas. O faturamento, no primeiro semestre, cresceu 20% em relação ao mesmo período do ano passado. O pico de vendas ocorreu entre maio e junho: nestes dois meses, o resultado é 40% maior do que em 2019. Os vinhos tranquilos puxaram estes números.
Mesmo com o mercado interno aquecido, as vinícolas estão ampliando as exportações. Como nossos vinhos estão sendo vistos lá fora?
O momento é de vender o vinho brasileiro com muito mais grife e, claro, além de reforçar a presença no Exterior, precisamos seguir educando nosso consumidor brasileiro de que os vinhos daqui são altamente premiados. A Salton criou a campanha Valorize o Vinho do Brasil, um projeto digital que defende o produto do nosso país e apresenta ao consumidor a bebida de forma mais clara, didática. Explicamos como conservar a bebida depois de aberta, a abrir um bom rótulo, qual a melhor forma de degustar, entre outras dúvidas populares. E é a qualidade do nosso produto que nos faz exportar para mais de 25 países. Um dos nossos principais mercados são os Estados Unidos e, por isso, vimos a necessidade de uma equipe in loco desde 2017. Outro mercado que estamos avançando são os países da América do Sul. Em 2019, foram embarcadas 800 mil garrafas e, para este ano, estimamos encerrar o ano com aproximadamente 1 milhão de garrafas exportadas.
Qual o impacto das comemorações na venda de espumantes? Qual a expectativa para o fim do ano?
Sem a realização de eventos, entendemos que é inevitável uma queda no consumo de espumantes. Afinal de contas, uma boa parcela da venda de espumantes sempre foi consumida em eventos corporativos, o que só deve retornar aos poucos. Acreditamos, porém, que, assim como houve a abertura de consumo para vinhos no primeiro semestre, o consumidor passe a experimentar e relacionar os espumantes com outros momentos fora de celebrações. Estamos nos preparando, sim, para as vendas do final do ano. Afinal, o Réveillon, como fechamento de ciclo, independentemente do formato, será comemorado. Quem sobreviver a todos os desafios neste 2020, a um cenário tão incerto e difícil, vai sentir a necessidade de comemorar.
A Vinícola Salton vem investindo muito no enoturismo. Como fica este trabalho a partir da pandemia?
O enoturismo é um dos braços que mais sentiu impacto com a pandemia. Na Salton, as atividades ficaram interrompidas desde março. Nós adotamos diversas medidas, como a comercialização de vinhos e espumantes pelo sistema de take away, com encomendas por telefone, WhatsApp ou e-mail. E, a partir deste mês, estamos reabrindo nossas portas de uma forma ainda mais segura e precavida. Não podemos deixar de priorizar a vida dos visitantes e da nossa equipe. Por isso, o tour foi adaptado. Agora é possível conhecer as principais atrações da vinícola e degustar os nossos rótulos em formato exclusivamente feito por agendamento. O atendimento é feito para grupos de no máximo 6 pessoas. E também criamos uma nova atração: passamos a oferecer uma experiência enogastronômica com tábuas de frios. E a partir de outubro, será inaugurado um novo espaço, que é uma galeria dedicada à exposição de peças de nosso acervo histórico, resgatando parte da evolução da Salton, a vinícola mais antiga em atividade no Brasil.