Na metade de 2018, o desenvolvedor de software Jaydson Gomes, 38 anos, saiu em uma viagem de férias depois de quatro anos sem períodos de descanso. Mas, no primeiro dia, percebeu que navegava no celular pelo feed do Instagram ao invés de descansar. Na época, às vésperas de eleições, ele se sentia estafado com a desinformação e a violência dos debates acirrados que lia nas redes sociais.
— Lá estava eu, em um lugar maravilhoso, mas querendo ver o que as pessoas falavam, ou que elas vissem onde eu estava e o que fazia — relembra Gomes, que na hora deletou as contas que tinha no Facebook, Twitter e Instagram para seguir viagem sem postar nada.
Sair das redes causou abstinência por um tempo pela angústia de não ver as fotos postadas pelos amigos ou os debates quentes na internet, conta o desenvolvedor. Isso porque, para ele, as redes sociais aliviam momentos de “microtédio”, mas na prática deixam as pessoas mais ansiosas. Ao abandoná-las, Gomes diz que deixou de passar entre três e quatro horas diárias no celular para se dedicar a hobbies, como o canto e a leitura.
— O modelo de negócios das redes sociais é (monetizar) a atenção das pessoas, então não é por acaso que ficamos presos em um feed. Isso foi feito por design, baseado em estudos, com algoritmos feitos conscientemente por essas empresas para ficarmos dentro dessas redes consumindo — afirma o desenvolvedor, que abandonou as redes sociais por também achar antiético o modo como elas são programadas.
Hoje, por exemplo, os brasileiros estão entre os que mais gastam tempo ao celular. No índice global, o país ocupa o segundo lugar, empatado com Arábia Saudita e Singapura. Em 2022, foram cerca de 5h20min diárias de uso por usuário do Brasil, em média – por volta de cinco minutos a menos que em 2021. Os dados são da consultoria data.ai, que publica anualmente o relatório State of Mobile sobre o uso de dispositivos móveis no mundo inteiro.
Um estudo publicado em janeiro deste ano na revista Journal of Technology in Behavioral Science, da Nature, acompanhou por três meses 50 universitários que usavam redes sociais no dia a dia e pediu a parte deles para reduzir o acesso. Em comparação ao grupo-controle que manteve o uso regular do aparelho, quem cortou horas de tela aliviou sensações de solidão e depressão, além de sentir melhoras na imunidade e no bem-estar geral.
Para além das redes sociais, o uso intensivo de celulares também pode estar relacionado ao vício em jogos digitais. Desde 2018, a Organização Mundial da Saúde (OMS) considera o abuso de videogames uma forma de dependência da mesma classe que a ludopatia, o vício em apostas. O uso excessivo de celulares, no entanto, ainda não é reconhecido como uma forma de vício, apesar de estar associado a uma série de danos à saúde mental, ortopédica e oftalmológica.