A invasão de uma reunião online entre pais e professores do Colégio São José, em Caxias do Sul, alertou sobre a privacidade de encontros virtuais. Este foi o primeiro caso registrado na Polícia Civil de Caxias do Sul, que investiga quem foi o autor das imagens obscenas. O temor é que este tipo de ato possa ocorrer durante aulas online, expondo crianças, ou que um invasor possa ter acesso a informações sigilosas de uma reunião de trabalho ou uma conversa familiar. A dica de prevenção de policiais e especialistas em tecnologia é conhecer as ferramentas que utilizam internet e ter cuidado ao compartilhar informações em redes sociais.
Os aplicativos de videoconferência se popularizaram diante da necessidade gerada com o distanciamento social diante da pandemia de coronavírus. Consultor que atua há duas décadas no mercado de tecnologia, Renê de Paula Junior aponta que os próprios aplicativos não estavam preparados para o aumento da demanda e, consequentemente, dos riscos de ataques cibernéticos.
— Tudo que se torna popular chama a atenção de quem é mal intencionado. As plataformas não estavam preparadas para a situação gerada pela pandemia e começaram a acontecer estes casos de invasões. A maioria são ataques maliciosos. Às vezes é apenas molecagem, outra são pessoas pervertidas, e também há questões políticas e campanhas de ódio — relata.
Em resposta, os aplicativos de videoconferência tiveram uma rápida evolução em sua segurança e privacidade. Diante da oferta, o consultor sugere a pesquisa sobre as plataformas e os recursos disponíveis para privacidade e controle. Ao mesmo tempo, cuidado com a cultura do grátis na internet, que pode ter falhas ou até ser maliciosa.
— Sempre há novos recursos aparecendo e vale a pena ficar atento. Hoje, toda plataforma presta atenção na inovação alheia e, quando um recurso aparece, é rápido para as outras fazerem algo semelhante. Então, há várias maneiras de se precaver. Só que estas dicas (de segurança) também envelhecem rápido, pois sempre surgem funcionalidades novas. A internet, como um todo, é uma corrida de gato e rato (entre sistema de segurança e invasores procurando falhas) — aponta Renê Júnior.
Em regra geral, os aplicativos mais populares atualmente são considerados seguros. A hipótese inicial para o caso do Colégio São José é que o invasor teve acesso ao link de convite da reunião por meio de uma rede social.
— É muito difícil ter uma vulnerabilidade (na plataforma). Para invadir um ambiente específico, teria que saber detalhes muito pontuais que não são públicos. Não é possível saber pelo aplicativo qual link e qual usuário é de uma escola. A tendência é que tenha sido por um convite que vazou ou foi repassado. O que recomendamos para estas aulas é que o link não seja disponibilizado de forma pública. Tem que ser mantido no ambiente escolar e acadêmico, evitando acessos indevidos — afirma o delegado Emerson Wendt, especialista em crimes virtuais.
Invasões se tornaram uma demanda à polícia
A invasão a reunião de pais e professores foi registrada na Polícia Civil como um ato obsceno, delito que tem pena prevista entre três meses a um ano de reclusão. Em princípio, nenhum menor de idade participava da sala virtual — o que acarretaria em um enquadramento penal mais grave do caso.
Segundo a ocorrência policial, o homem não identificado entrou na sala virtual e passou a se masturbar. A cena não chegou a durar um minuto, pois o homem teve o acesso removido da reunião. Conforme o vice-diretor da escola, Jorge Godoy, o link para a reunião na plataforma Zoom foi enviado somente para pais e alunos e 111 pessoas participavam do encontro.
Como este é o primeiro caso registrado na cidade, os policiais caxienses devem consultar a Delegacia de Crimes Virtuais, que tem sede em Porto Alegre. O delegado Vitor Carnaúba, contudo, aponta que a investigação é semelhante a de outros delitos envolvendo nudez na internet.
— O que temos muito é remessa, envio de imagens por e-mail ou WhatsApp. Uma questão direta de uma pessoa para a outra. De invasão de um chat, de uma reunião, é o primeiro registrado. Iremos entrar em contato com a plataforma e também buscamos entender como esta pessoa conseguiu o convite — analisa.
O padrão de investigação é o rastreamento do dispositivo utilizado para envio das imagens. O delegado Carnaúba afirma que, na maioria das vezes, os investigadores conseguem identificar o autor. No entanto, a velocidade da investigação depende das empresas de tecnologia envolvidas que repassam as informações, pois algumas tem escritórios internacionais.
— Não é simples. Quando eram computadores fixos, era mais fácil. Hoje, há muitos celulares e os dados destes telefones móveis não são tão confiáveis — afirma o delegado Carnaúba.
Segundo o delegado Wendt, a invasão de link, seja de aulas ou reuniões, se tornou uma demanda nos últimos 30 dias no Estado, justamente por efeito da pandemia. A orientação é a mesma sobre outros golpes e riscos na internet: procure sabe a origem de links recebidos e cuidado para não divulgar informações privadas nas redes sociais.
— Este tipo de invasão passou a ser comum, infelizmente. A lógica é que cada pessoa que entra no provedor deixa um registro. Esse provedor tem a capacidade de identificar todos que participaram, incluindo a pessoa que cometeu este ato. O primeiro passo é o mais importante, que é o registro da ocorrência — complementa o delegado Wendt.
DICAS DE SEGURANÇA
:: Não compartilhe o link da reunião de maneira pública.
:: Oriente os convidados a não repassarem os links de acesso.
:: Crie uma sala de espera onde os participantes aguardam para ter a entrada autorizada pelo organizador da videoconferência.
:: Crie login e senha para os convidados.
:: Prefira repassar os convites e senhas da reunião por e-mail.
:: O organizador pode fechar o acesso a reunião após todos os convidados estarem presentes ou a reunião ter iniciado.
:: Peça para os convidados conectarem 15 minutos antes da reunião de fato. Este procedimento auxilia a verificar a segurança e evitar gafes, como problemas no microfone ou internet, e até quem esquece a câmera ligada e vai ao banheiro. Em regra geral, os encontros costumam atrasar alguns minutos justamente em razão destes preparativos.