A decisão de permitir a volta às aulas presenciais é polêmica. Mesmo entre profissionais da saúde, os pontos de vista são diferentes. Mas há uma unanimidade: os cuidados terão de ser redobrados para garantir segurança às crianças que retornarão aos prédios das escolas de Educação Infantil de Caxias do Sul.
O pediatra Marcelo Saldanha, que atua há 25 anos em UTIs pediátricas, é contra a volta presencial. Segundo ele, embora as crianças não costumem ter agravamento da covid-19, a circulação delas pode levar à disseminação do vírus de forma mais rápida. Além disso, o médico salienta que o ano foi atípico para outras doenças respiratórias que costumam acometer as crianças, com redução de casos das chamadas bronquiolites, que afeta principalmente aquelas com menos de um ano. Na avaliação dele, a abertura das escolas pode contribuir para o aumento desses casos e, como consequência, das hospitalizações.
As instituições terão de seguir uma série de protocolos sanitários, com o objetivo de evitar a contaminação. A Secretaria da Saúde recomenda o uso de máscaras em tempo integral para crianças com mais de dois anos, além da higienização constante das mãos e do distanciamento social. Para o médico, esses são desafios a serem superados diante da falta de maturidade dos pequenos, mas ele salienta que é preciso reforçar os cuidados para facilitar a compreensão:
— O que a gente recomenda para as crianças é usar a velha e tradicional lavagem das mãos, o álcool gel e as máscaras. A gente tem que ter uma disciplina e ensinar muito as crianças a não tocar no seu rosto, a não ser que esteja com as mãos limpas. Nós temos o hábito de ficar tocando nos nossos olhos, na nossa boca, e esse é o grande mecanismo de propagação dessa doença.
Saldanha também salienta que será necessário o cuidado com a pele das crianças. Como elas terão de usar álcool gel, que causa irritação, a orientação do médico é usar cremes para a proteção e hidratação. Segundo o pediatra, uma boa alternativa é o uso de óleo de coco. Outra preocupação é com o cuidado com as roupas: assim que a criança chegar em casa, ela deve tirá-la e tomar banho imediatamente, explica o médico.
A fisioterapeuta Daniela Marin, que trabalha em uma escola de Educação Infantil, ajudou a montar o protocolo de higiene da instituição. Ela conta que as escolas estão cada vez mais preocupadas em garantir a saúde dos pequenos, mesmo antes da pandemia de coronavírus. Para Daniela, é possível voltar às aulas neste momento de forma segura. Nesse sentido, além dos alunos, as famílias serão orientadas sobre como fazer o processo da forma correta. A fisioterapeuta avalia que as escolas serão ambientes mais seguros que o de cuidadores com os avós, que muitas vezes têm doenças crônicas.
—Eu acredito que a Vigilância (Sanitária) vai estar muito em cima desses cuidados, desses protocolos que foram lançados, porque no papel é muito bonito. A teoria é muito bonita, mas a prática tem que ser executada, porque isso é em benefício da saúde das crianças, dos familiares e dos funcionários.
Os dois especialistas, assim como a Secretaria Municipal da Saúde, destacam que quando as crianças estão com sintomas respiratórios não devem frequentar as escolas. Além disso, diarreia e dor de cabeça forte também podem ser sintomas de covid-19. Outro ponto, destaca Daniela, é que quando essas crianças tiverem contato com familiares com sintomas de infecção por coronavírus, elas não podem ir à escola. Quando algum deles apresentar sintomas na escola, será levado para uma sala reservada para isso e encaminhada para o atendimento médico.
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Para evitar a contaminação, as escolas terão de seguir uma série de recomendações em comum. Os recreios e o uso de bebedouros estão proibidos. As escolas devem manter os ambientes ventilados e as crianças devem ficar a 1,5 metros de distância. A atenção começa antes mesmo de entrar no prédio da instituição, ressalta o secretário da Saúde de Caxias, Jorge Olavo Hanh Castro:
— Cuidar para que a escola não faça acúmulo de pessoas na entrada e a mesma coisa na saída. E orientar as crianças maiores a não confraternizarem com os colegas, embora isso seja bem difícil. Não compartilhar merenda, lanches, bebidas — explica.
Desafio do ponto de vista psicológico
Depois de quase seis meses em casa, o retorno às escolas vai demandar uma readaptação dos pequenos também do ponto de vista psicológico. Mesmo após períodos de férias, que normalmente são de 30 dias, esse processo costuma ser necessário.
Um dos aspectos é a própria rotina comum das escolas que é mais bem definida que a de casa, onde há uma flexibilidade maior de tarefas. Dessa vez, haverá ainda a necessidade de implantar uma série de novos processos e seguir novas orientações, como o próprio distanciamento dos colegas.
— Quando a criança entra na escola a primeira vez, a gente faz uma adaptação gradual. Eu acredito muito que a gente vai ter que fazer uma nova adaptação. Vão aparecer alguns comportamentos, como ansiedade. Eu já posso notar, a nível de psicóloga clínica, que têm muitas crianças que estão preocupadas com o “bichinho” que está andando por aí e, claro, que isso vai refletir na escola. Então, eles estão com saudades dos amigos, mas também estão inseguros — afirma a psicóloga infantil, Nadaby Pites.
Ela recomenda que os pais fiquem atentos a mudanças de comportamento, como aumento da agressividade, do choro, mudança no apetite, no sono e no sistema urinário. São essas situações que podem indicar que a criança está atravessando uma dificuldade maior que a comum para frequentar a escola, já que elas não sabe comunicar o que sentem por meio da fala:
— A gente tem que notar as mudanças de comportamento, porque é muito através das mudanças de comportamento que a criança demonstra que tem alguma coisa que não está legal.
Para poder ajudar as crianças, o primeiro passo, afirma a psicóloga, é o próprio adulto se dar conta de como tem se sentido. Será difícil para ele transmitir segurança e tranquilidade se estiver se sentindo altamente ansioso. Além disso, a psicóloga destaca que é preciso que os pais sejam o exemplo para que as crianças sigam as normas de uso de máscaras, higienização das mãos e distanciamento.
Nadaby considera que os professores também podem apresentar quadros de maior preocupação, mas explica que escolas estão atentas a isso e oferecendo suporte do ponto de vista psicológico tanto para os pais quanto para os profissionais.
Recomendações
- Crianças com mais de dois anos devem usar, em tempo integral, máscaras. A retirada só é permitida para o lanche
- As crianças devem ficar a 1,5 metros umas das outras
- Recreios estão proibidos
- Janelas e portas devem ficar ao menos parcialmente abertas para circulação do ar
- Bebedouros não podem ser usados
- Utensílios e brinquedos não podem ser compartilhados
- As mãos devem ser higienizadas antes e depois do lanche, após o uso do banheiro e de forma frequente
- Crianças com sintomas gripais _ como coriza, febre, calafrios, dor de garganta, dor de cabeça e diarreia _ não devem ser levadas para a escola
- Se alguém da família tiver sintomas gripais ou teste positivo para a covid-19, a criança não deve frequentar a escola
- Os pais e professores devem orientar as crianças para não haver beijos, abraços ou apertos de mão
- As crianças que estão frequentando a escola não devem visitar quem está no grupo de risco para a covid-19
- Crianças devem ser orientadas a não mexer no rosto, mesmo com máscara. Aquelas com problemas de visão devem receber o reforço para não tocarem nos óculos.
Fontes: Secretaria Municipal da Saúde, pediatra Marcelo Saldanha e fisioterapeuta Daniela Marin
Sinais de atenção para a covid-19 em crianças:
- febre moderada (até 38,5 graus)
- diarreia
- lesões de pele
- perda de apetite
- sintomas respiratórios: tosse, falta de ar, dor de garganta, coriza
- caso a criança esteja muito abatida, sem ânimo para brincar.
Fontes: pediatra Marcelo Saldanha e fisioterapeuta Daniela Marin
Outras doenças
Além da covid-19, os pais devem ficar atentos à possibilidade da criança pegar também outras doenças. As chamadas bronquiolites são as mais preocupantes, conforme o pediatra Marcelo Saldanha:
— A criança que está com uma febre alta e persistente, tem uma dificuldade para respirar e está prostrada, é motivo para procurar atendimento médico de urgência, porque provavelmente essa criança tem alguma coisa mais complexa — afirma.