O ex-presidente Evo Morales denunciou neste domingo (27) que "agentes do Estado" boliviano tentaram assassiná-lo em um ataque a tiros contra seu veículo, que feriu seu motorista em Cochabamba (centro), e comunicou o episódio à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).
"Denuncio de maneira urgente" ante a CIDH "que agentes de elite do Estado Boliviano atentaram contra a minha vida no dia de hoje [domingo]", informou Morales, presidente da Bolívia entre 2006 e 2019 e que atualmente trava uma disputa com seu ex-ministro da Economia e atual chefe de Estado, Luis Arce.
Morales afirma que seu veículo tinha foi alvo de "14 disparos", quando se dirigia para seu programa semanal de rádio na região cocaleira do Chapare (centro), seu reduto político.
Segundo a sua versão, o fato ocorreu "enquanto o governo reativa operações conjuntas entre forças policiais, militares e paramilitares", para desarticular bloqueios de vias principalmente no departamento de Cochabamba, que neste domingo completam 14 dias.
Os bloqueios começaram como um rechaço a uma eventual prisão de Morales, investigado pelo Ministério Público pelos supostos crimes de estupro, tráfico e exploração de pessoas contra uma menor em 2015, com quem teve uma filha um ano depois.
Os manifestantes também exigem do presidente Luis Arce soluções para a crise econômica.
Há 19 pontos de bloqueio em Cochabamba, em rotas que ligam às cidades de La Paz e Santa Cruz (leste).
Os bloqueios acentuaram a escassez de combustível e fizeram disparar os preços dos produtos básicos nas principais cidades do país.
Segundo o Ministério do Desenvolvimento Produtivo e Economia Plural, os bloqueios já provocaram perdas de quase 1,2 bilhão de dólares (6,85 bilhões de reais).
O ex-presidente indígena também assinalou que o governo prepara um "estado de sítio" ou estado de exceção que limita as liberdades de locomoção e reunião para acabar com os bloqueios.
O Comando das Forças Armadas negou envolvimento no suposto atentado denunciado por Morales e pediu "calma" aos seguidores do ex-presidente, depois que eles ameaçaram tomar os quartéis.
"O Comando das Forças Armadas do Estado nega categoricamente as falsas acusações relacionadas com o suposto atentado ao ex-presidente Evo Morales", afirmou a instituição militar em um comunicado.
Arce, por sua vez, respondeu através da rede social X que instruiu "uma investigação imediata e minuciosa para esclarecer os fatos" denunciados por seu antigo mentor político.
"O exercício de qualquer prática violenta na política deve ser condenado e esclarecido", indicou o presidente, envolvido em uma disputa com Morales pela candidatura presidencial de 2025.
- 'Encapuzados' -
Morales disse que os disparos foram efetuados por homens "encapuzados".
Segundo um comunicado do Movimento Ao Socialismo (MAS), partido fundado pelo ex-presidente, o ataque aconteceu na entrada de um quartel militar em Cochabamba, onde indivíduos com "armas longas, vestidos completamente com roupas pretas", atiraram contra os veículos que formavam a comitiva de Morales.
Em um vídeo divulgado pela rádio Kawsachun Coca é possível observar três buracos, provavelmente provocados por tiros, no para-brisa da caminhonete em que Morales viajava. O motorista tem sangue na cabeça e uma mulher pede que ele "se apresse".
O vice-ministro de Segurança Pública, Roberto Ríos, disse que as autoridades vão investigar o ocorrido, mas também consideram a possibilidade de que tenha sido um "autoatentado".
O incidente também acontece em meio às investigações do MP contra Morales no caso de suposto estupro, exploração e tráfico de pessoas.
Em 11 de outubro, uma promotora responsável pelo caso abriu a possibilidade de emitir um mandado de prisão contra Morales, e o ex-presidente classificou essa ação como o resultado de uma manobra política, porque o caso foi encerrado em 2020.
- Solidariedade e repúdio -
Os governos de Colômbia, Cuba, Venezuela e Honduras expressaram, separadamente, solidariedade a Morales e condenaram o incidente deste domingo.
"Toda a minha solidariedade a Evo, o fascismo cresce em toda a América Latina", assinalou no X o presidente colombiano, Gustavo Petro.
Nicolás Maduro, mandatário venezuelano, afirmou via Telegram: "Rejeito e repudio energicamente a tentativa de assassinato, neste domingo, contra o irmão Evo Morales."
O chanceler cubano, Bruno Rodríguez, também rechaçou "a tentativa de assassinato do irmão Evo Morales".
Contudo, o Ministério das Relações Exteriores boliviano denunciou no sábado, em um comunicado, que estão em curso "ações desestabilizadoras lideradas por Morales que pretendem interromper a ordem democrática", o que ameaça a estabilidade da Bolívia e da região.
* AFP