O Tribunal Penal Internacional (TPI) emitiu, nesta sexta-feira (17), um mandado de prisão contra o presidente da Rússia, Vladimir Putin, pela deportação de crianças de partes da Ucrânia ocupadas por Moscou, que denunciou uma decisão juridicamente "nula".
O tribunal de Haia também emitiu um mandado de prisão pelo mesmo motivo, considerado um crime de guerra, contra a comissária presidencial para os Direitos da Infância na Rússia, Maria Alekseyevna Lvova-Belova.
O presidente da Ucrânia, Volodimir Zelensky, elogiou a "decisão histórica", que "dará início a uma responsabilidade histórica" na prestação de contas pelos atos cometidos pelas tropas russas desde o início da invasão da Ucrânia, em fevereiro de 2022.
O TPI não detalhou como pretende executar os mandados de prisão, considerando que a Rússia não é membro desse tribunal, como Moscou fez questão de lembrar de imediato.
"A Rússia, como um certo número de Estados, não reconhece a competência desse tribunal e, consequentemente, do ponto de vista da lei, as decisões desse tribunal são nulas", declarou o porta-voz do presidente russo, Dmitry Peskov.
Mais de 16.000 crianças ucranianas teriam sido deportadas à Rússia desde o início da invasão e muitos foram transferidos a instituições e casas de acolhimento, segundo Kiev.
- 'Cooperação internacional' -
O presidente do tribunal, Piotr Hofmanski, declarou que os mandados de prisão foram emitidos após uma demanda do procurador-geral do TPI, o britânico Karim Khan, pelos "supostos crimes de guerra de deportação de crianças dos territórios ucranianos ocupados para a Federação da Rússia".
A execução desses mandados depende "da cooperação internacional", acrescentou.
Durante um encontro com Putin em meados de fevereiro, Lvova-Belova declarou que havia adotado um menino de 15 anos de Mariupol, cidade do sul da Ucrânia ocupada por Moscou desde maio.
"Agora sei o que significa ser mãe de um menino do Donbass, é um trabalho difícil, mas amamos um ao outro com certeza", disse.
"Evacuamos lares de crianças para áreas seguras, conseguimos reabilitação e próteses para elas e entregamos ajuda humanitária", acrescentou.
Após a emissão da ordem de prisão, Lvova-Belova garantiu que continuaria realizando seu trabalho na Comissão de Direitos da Infância.
Por sua vez, o ex-presidente russo Dmitry Medvedev comparou o mandado emitido pelo TPI a papel higiênico. "Não há necessidade de explicar onde esse papel deve ser usado", tuitou em inglês, junto com um emoticon de papel higiênico.
- 'Espólio de guerra' -
A emissão de um mandado de prisão contra um chefe de Estado em exercício e membro do Conselho de Segurança da ONU é um passo inédito para o tribunal criado em 2002.
O procurador-geral Karim Khan investiga há mais de um ano possíveis crimes de guerra ou contra a humanidade cometidos na Ucrânia.
Khan declarou este mês, após uma visita à Ucrânia, que os supostos sequestros de crianças eram alvo de "uma investigação prioritária".
"As crianças não podem ser tratadas como espólio de guerra", disse.
Hofmanski lembrou que a Convenção de Genebra proíbe que as potências de ocupação façam transferências de civis.
Em um comunicado, o TPI declarou que "existem motivos razoáveis para pensar que Putin é pessoalmente responsável pelos crimes mencionados".
O líder russo é supostamente responsável de maneira direta por esses atos e por sua "incapacidade de exercer controle apropriado sobre os subordinados civis e militares" que os cometeram ou permitiram que fossem cometidos, ressaltou.
Nem Rússia nem Ucrânia são parte do TPI, mas o governo de Kiev aceitou a jurisdição do tribunal e está colaborando com o procurador-geral.
A Rússia nega ter cometido crimes de guerra em sua operação militar.
O presidente americano, Joe Biden, garantiu que a ordem de captura está "justificada". Embora os Estados Unidos tampouco sejam membros do TPI, a decisão "envia um sinal muito forte".
O alto representante de política externa da União Europeia, Josep Borrell, considerou a decisão do TPI como o início de um processo para que a Rússia preste "contas".
O governo britânico louvou a medida e disse que a mesma obrigaria "os que estão na cúpula do regime russo, inclusive Vladimir Putin, a prestar contas".
O conflito na Ucrânia fará parte das conversas entre Putin e seu homólogo chinês, Xi Jinping, que visitará Moscou na semana que vem.
Pequim não condenou a ofensiva militar e tenta se apresentar como um ator neutro no conflito.
Embora a Rússia tenha elogiado a "moderação" de Xi no conflito, os Estados Unidos acreditam que o pedido de cessar-fogo de Pequim consolidaria a "conquista russa".
* AFP