As finanças e, em especial, a criação de um fundo de perdas e danos pela mudança climática, bloqueavam as negociações, nesta quinta-feira (17), na conferência anual da ONU sobre o clima (COP27), no Egito, a um dia de seu encerramento oficial.
"Existe claramente uma falta de confiança entre o Norte e o Sul", alertou o secretário-geral da ONU, António Guterres.
"A maneira mais efetiva de reconstruir essa confiança é mediante um acordo ambicioso e crível sobre as perdas e danos e o apoio financeiro aos países em desenvolvimento", acrescentou.
Os países do Sul mostraram uma frente comum para exigir a criação de um fundo, o que provocou uma contraproposta da União Europeia (UE) nas últimas horas da noite.
"O que propomos é estabelecer um Fundo de Resposta a Perdas e Danos para os países mais vulneráveis", disse o vice-presidente da Comissão Europeia, Frans Timmermans, em sessão plenária.
Em troca, disse Timmermans, os 200 países da COP devem se comprometer decisivamente a aumentar suas medidas de mitigação, ou seja, reduzir drasticamente suas emissões de gases de efeito estufa.
Dessa forma, o objetivo de controlar o aumento da temperatura média do planeta para +1,5ºC, que era o compromisso de todos há sete anos, na Declaração de Paris de 2015, poderia ser mantido vivo.
A proposta europeia foi recebida positivamente, mas ainda restam 24 horas de intensas negociações pela frente.
"Há notícias positivas, mas ao mesmo tempo há muitos pontos de vista divergentes", explicou o representante do Paquistão, Nabeel Munir, em nome do grupo mais amplo de países em desenvolvimento (G77).
- China e Estados Unidos -
A posição da China e dos Estados Unidos, os maiores emissores de gases de efeito estufa do planeta, será decisiva na reta final das negociações.
Apesar de suas políticas climáticas decididamente progressistas, os Estados Unidos até agora se opuseram à criação de um mecanismo específico de perdas e danos, temendo ações judiciais internacionais de países que sofrem desastres naturais.
Também resta saber quem contribuiria para esse fundo.
A China quer continuar sendo considerada um país em desenvolvimento e, portanto, não quer ser forçada a contribuir com financeiramente.
"Todos devem contribuir. E isso é algo que comuniquei a todos os nossos parceiros, também ao meu colega e negociador chinês, Xie Zhenhua", havia declarado Timmermans horas antes.
"Se estamos falando de justiça, devemos olhar para a posição em que os países estão agora, e não há 30 anos", acrescentou.
Por sua vez, a ministra colombiana do Meio Ambiente, Susana Muhamad, pediu que medidas de cancelamento de dívidas também sejam abordadas na discussão.
- Valores astronômicos -
Os números que estão sendo ventilados para danos diretos e indiretos devido à mudança climática são astronômicos.
Segundo o Grantham Institute, as perdas e danos podem atingir entre US$ 290 bilhões e US$ 580 bilhões anualmente em 2030.
A discussão sobre esse fundo foi aberta na COP26, realizada em Glasgow, há um ano.
Oficialmente, os quase 200 países negociadores ainda têm dois anos para chegarem a um acordo, mas o tema foi incluído na agenda desta conferência em Sharm el-Sheikh.
A pressão dos países em desenvolvimento é máxima para tentar avançar etapas na atual edição.
Esse não é o único tema financeiro polêmico.
Os US$ 100 bilhões anuais prometidos pelos países ricos àqueles em desenvolvimento para mitigar suas emissões de gases de efeito estufa e se adaptar à mudança climática não se materializou totalmente.
E, em Sharm el-Sheikh, as partes deveriam discutir o que fazer a esse respeito depois de 2025, quando esse montante deve ser aumentado.
O presidente brasileiro eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, que foi recebido como um herói na COP27 na quarta-feira, declarou, por sua vez, que quer "reconstruir" o país e, para isso, pediu ajuda em um encontro com a sociedade civil .
* AFP