Laura Shin é uma jornalista que cobre criptomoedas, apresenta o podcast Unchained e foi editora sênior da Forbes. Abaixo, ela compartilha cinco insights importantes presentes em seu novo livro, Cryptopians: Idealism, Greed, Lies, and the Making of the First Big Cryptocurrency Craze (Criptopianos: Idealismo, Ganância, Mentiras e a Primeira Grande Onda de Fixação por Criptomoeda).
- O PODER ESTÁ MIGRANDO DAS MÃOS DAS EMPRESAS PARA CODIFICADORES.
Meu livro conta a história do Ethereum, o segundo maior criptoativo de mercado. Seu grupo inicial de oito cofundadores era formado por desenvolvedores (ou “devs”) e empresários. Mas, logo nos primeiros meses, as tensões entre eles aumentaram, culminando então na prevalência dos programadores.
Por outro lado, quando a criptomoeda ainda estava em processo de desenvolvimento, um dos cofundadores da Coinbase, Fred Ehrsam, disse que quando era programador na Goldman Sachs, era basicamente considerado um cara de TI. Os empresários ficavam sentados, dando ordens com os pés sobre a mesa.
A Wall Street costumava ser considerada o centro do poder, mas, aos poucos, começou a migrar para o Vale do Silício. Porém, com a ascensão da criptomoeda, tornou- se tornou global.
Tenho fontes que viraram “zilionários” em pouquíssimos anos, em locais tão diversos e inesperados como Filipinas, Índia e Brasil. Todos eles programadores que aprenderam a codificação blockchain, logo, não precisam trabalhar para uma entidade corporativa para ganhar dinheiro, nem mesmo precisam estar geograficamente perto do Vale do Silício. Eles se sentam em casa e fazem tudo remotamente.
- O PODER ESTÁ MIGRANDO DAS MÃOS DE PLAYERS CENTRALIZADOS PARA ORGANIZAÇÕES DESCENTRALIZADAS.
O poder do Bitcoin é notável, pois alcançou um valor de mercado de aproximadamente US$ 1 trilhão sem ajuda de um CEO, conselho executivo ou contratação de funcionários. Tudo isso foi possível devido ao seu design tanto como ativo quanto como rede. As pessoas que executam o software Bitcoin participam de concursos a cada 10 minutos para ganhar os novos bitcoins gerados pelo programa.
Para eles, é uma chance de ganhar dinheiro, enquanto o Bitcoin se beneficia da segurança adicional, já que quanto mais computadores na rede, mais difícil é para qualquer entidade controlá-lo. Essa é uma abordagem inovadora quando comparada à contratação de um departamento inteiro de TI, que gera custos adicionais.
O Bitcoin foi o primeiro exemplo de uma organização descentralizada (onde não há necessidade de um empresário para gerenciá-la), mas meu livro adentra no Ethereum, uma plataforma para criar qualquer tipo de aplicativo descentralizado. Ele funciona como uma App Store para desenvolvedores criarem e fazerem upload de aplicativos descentralizados – tudo sem CEOs, conselhos ou contratos legais.
Esses grupos são chamados de DAOs (“descentralized autonomous organizations” ou organizações autônomas descentralizadas, em português). Pode-se dizer que são como pequenas democracias. Algumas pessoas apresentam propostas a eles e, caso seja aprovada, executam o seu trabalho.
Os DAOs podem contar com milhares de membros ou ser composto por um pequeno grupo de amigos que investem em criptomoedas ou NFTs juntos. Estão longe de operar como startups ou empresas tradicionais. As decisões são tomadas de forma coletiva e os espólios são compartilhados entre todos.
- MESMO QUANDO SE TRATA DE TECNOLOGIA, A POLÍTICA E AS PESSOAS SÃO IMPORTANTES.
Uma ferramenta popular no Ethereum são os softwares conhecidos como contratos inteligentes – programas automatizados que (como os bots de bate-papo) realizam várias transações. Eles são frequentemente descritos como uma máquina de venda financeira.
Isso faz parecer que estão livres da influência humana. Programadores tendem a dizer que isso faz parte do que gostam de chamar de “tecnologias sem confiança”, mas sistematicamente os envolvidos (e as tensões entre eles) afetam o curso das coisas. Mesmo essas chamadas máquinas, que interagem com mercados mais amplos, estão sujeitas à manipulação.
Um desenvolvedor em particular foi fundamental para a arquitetura do Ethereum. Ele era brilhante, mas também arrogante, e não sentia constrangimento algum em apontar os erros de outras pessoas. Após ser expulso da Ethereum Foundation, ele se tornou ainda mais controverso, escrevendo postagens em blogs que criticavam o software da fundação.
Anos mais tarde, ele arrecadou cerca de US$ 145 milhões em ether para um novo projeto, mas devido a uma falha na carteira que ele e sua equipe desenvolveram para manter esse dinheiro, US$ 90 milhões ficaram inutilizáveis. A Ethereum poderia ter feito algo para tentar descongelar o dinheiro, mas após anos de tensões entre eles, não estavam nem um pouco dispostos a ajudá-lo.
Entusiastas das criptomoedas e dos blockchain gostam de sonhar com um mundo em que confiar em humanos não será necessário e em que as transações financeiras poderão ser garantidas com o código certo. Mas a forma como as pessoas se relacionam no setor pode ter um impacto imenso no desenvolvimento dos chamados “sistemas sem confiança”.
- A REPUTAÇÃO VALE MAIS DO QUE O DINHEIRO.
No meu livro, publiquei em primeira mão quem estava por trás do maior roubo de ether de todos os tempos – aproximadamente US$ 11 bilhões – e a forma como o hacker agiu.
Ele teve bastante tempo e chances de devolver os fundos e, pouco antes da invasão, entrou em contato com os criadores para apontar as falhas do fundo de risco descentralizado. Se ele tivesse hackeado o sistema, mas se apresentasse e dissesse que devolveria o dinheiro após ter apresentado seu ponto de vista, a comunidade o consideraria um herói.
De fato, hoje existem alguns especialistas em segurança que se tornaram famosos ao identificar códigos defeituosos e resgatar o dinheiro antes que ele pudesse ser hackeado. Um dos criadores do DAO descobriu a identidade do suspeito e disse que ele perdeu uma grande oportunidade de corrigir a situação: “Ele acabou enfiando os pés pelas mãos. Ter uma boa reputação vale muito mais do que dinheiro.”
- CUIDADO COM SEUS PARCEIROS DE NEGÓCIOS.
O criador do Ethereum, Vitalik Buterin, teve a ideia de um novo tipo de blockchain. Ele escreveu um white paper (documento longo e detalhado, que aborda um assunto de forma técnica e aprofundada) e o enviou para 13 amigos em novembro de 2013, no mesmo dia em que o bitcoin ultrapassou a marca de US$ 1 mil pela primeira vez. Quando viram o potencial do Ethereum, perceberam que poderiam ficar milionários. Logo, o grupo inicial da plataforma se tornou uma mistura de idealistas e oportunistas.
Nos anos seguintes, Buterin se viu em uma crise após a outra. Além disso, ele tinha bastante dificuldade em dizer não às pessoas, o que o colocou em várias situações em que era anulado por colegas mais enérgicos e gananciosos. Após anos de aprendizado, ele finalmente encontrou um grupo de amigos de verdade, que não estavam com ele para proveito próprio. Ele passou a entender como não ser capaz de defender a si mesmo e seus princípios poderia prejudicar os outros e o Ethereum.
O post Entenda de uma vez as pessoas, o poder e a política por trás das criptomoedas apareceu primeiro em Fast Company Brasil | O Futuro dos Negócios.