Sabe aquelas faxinas anuais que nos obrigamos a fazer no armário, com direito a dilemas sobre o que fica e o que sai dos cabides? Para Fernanda Paes Leme, essa tarefa nunca foi complicada. Abrir gavetas e fazer as roupas que não usa mais circularem sempre foi rotina no closet da artista de 35 anos. Sobra até para os amigos famosos: todo ano, ela organiza um bazar beneficente com peças que vêm direto do guarda-roupa de nomes como Giovanna Ewbank, Fernanda Rodrigues, Bruno Gagliasso e Hugo Gloss.
Há três anos, a consciência fashion de Fê se transformou no programa Desengaveta, do canal por assinatura GNT, que estreia a terceira temporada nesta segunda-feira (6). Na atração, um repeteco do que a apresentadora faz na vida real: a cada semana, ela visita a casa de uma celebridade para um papo sobre consumo consciente e, claro, muitos desapegos, que vão direto para um bazar beneficente no Enjoei!, plataforma especializada na venda de itens de moda. A ideia é estimular quem assiste a experimentar o desapego fashion também:
– As pessoas ficam muito animadas, querem fazer o mesmo em casa. A gente não usa tudo o que teme não precisa de tudo o que tem no seu closet. E falo isso me incluindo também – explica Fernanda, em entrevista à Donna por telefone.
No ano em que completa duas décadas de carreira - sim, foi em 1998 que conhecemos a malvadinha Patty do seriado Sandy & Junior -, ela encarou uma empreitada dupla como apresentadora. Além do Desengaveta, estreou no GNT também o Missão Design, reality de competição que mistura décor com sustentabilidade. Os participantes são desafiados a montar um ambiente reaproveitando e ressignificando itens antigos, sempre correndo contra o relógio. Tudo a ver com a filosofia que vem norteando as escolhas da apresentadora e atriz na hora de consumir: mais do que nunca, quer estar atenta aos impactos do que compra e usa ao meio ambiente. Não à toa, sustentabilidade e consumo consciente viraram bandeiras suas para além da TV.
Com leveza e bom humor, Fê Paes Leme conversou com Donna, entre outros temas, sobre a virada de chave na sua carreira, que revelou ao público um pouco mais de personalidade na versão apresentadora.
– Sempre fui uma boa personagem de mim mesma (risos). Isso é um ganho para você apresentar. Causa uma empatia, aproxima. Não há nada para você se esconder por trás. Você precisa estar ali e gostar de se comunicar. E eu sou assim, desde pequena. Como boa geminiana, sou uma boa comunicadora – conta.
O resultado do nosso papo, que vai de consumo consciente a feminismo e redes sociais, você confere a seguir:
Você está completando 20 anos de carreira, que inclui trabalhos como atriz e, nos últimos anos, na versão apresentadora. Olhando para trás, como avalia essa trajetória?
Realmente, 20 anos é uma vida! Estou fazendo um filme com meninas supernovas, e outro dia perguntei para a (atriz) Giovanna Grigio: “Quantos anos você tem?”. E ela respondeu: “Vinte!”. Pensei: “Tenho essa idade de profissão!”. É difícil fazer o próprio balanço, mas é muito necessário olhar para trás. É o que faz com que a gente continue querendo caminhar. Quando olho para trás vejo muitos altos e baixos, mas ao mesmo tempo mais altos do que baixos. Desde os sete anos dizia que queria estar na TV. Aos nove, fui para uma agência e comecei a fazer testes, até que surgiu o piloto do seriado Sandy e Junior. E foi fazendo que vi que era isso que eu queria.
Que lembranças você guarda desta época?
Meu primeiro trabalho foi muito marcante, tanto que me fez chegar aonde estou. Fazer a antagonista da Sandy em uma série que foi um sucesso, que as pessoas lembram até hoje. Tenho um carinho muito especial por esse trabalho, guardo no meu coração. A gente era feliz e sabia!
Você começou a carreira de apresentadora com programa Superstar, que estreou em 2014. Como foi essa virada de chave?
Foi uma surpresa para mim. Quando o Boninho me convidou, pensei: “Como assim? Não entendi”. Foi muito importante para mim. Não era uma visão minha: ele me enxergou dessa forma. O melhor conselho que recebi do Boninho foi quando perguntei o que ele queria que eu fizesse. “Quero que você seja você mesma”, ele me disse. E isso nunca saiu da minha cabeça. Toda vez que vou apresentar um programa, seja o Superstar, o X Factor, o Missão Design e o Desengaveta, eu lembro disso. É esse o grande acerto.
Em junho, você completou 35 anos. O que significou entrar na casa dos 30?
Não é fácil, mas também não é difícil. A gente que complica um pouco. Não troco a Fernanda de 35 pela de 10 anos atrás. Tenho muita sorte de ter vivido intensamente os meus 20 e poucos anos. Quando a gente está bem com o nosso passado, é impossível o presente não ser bom. É claro que a análise ajudou muito no processo. Mas não tenho questionamentos. O que mais prezo na vida é ter leveza. É o que eu busco, independentemente de idade. Me sinto muito melhor agora. No meu aniversário, um amigo perguntou quantos anos eu estava fazendo, e, quando respondi, ele disse: “Ih, tem que congelar óvulo!”. Respondi: “É isso que você tem para falar, no dia em que completo 35 anos? Ir para esse lado do que a sociedade acredita que tenha que ser uma mulher de 35 anos, casada, com filhos? Isso já era”. Tenho que estar bem comigo, é o que importa. É claro que mudou. Hormônios mudam. Existe uma sociedade machista, que nos pressiona mesmo sem querer com comentários de um amigo, da mãe, da avó... E até em comentários de Instagram. Isso existe, está imbuído em a gente achar que uma mulher de 35 anos precisa estar com alguém e pensar em ter filho. Não é que eu não pense (em ter filhos), mas tudo bem não estar (pensando no momento).
Como você vê esse momento das mulheres?
Estamos falando muito de empoderamento, de feminismo. É tão importante falarmos sobre isso. Há quem diga que é radicalismo. Tem questões como feminismo, preconceito, machismo, que a gente precisa chegar com o pé na porta. Se não for assim, talvez não seja compreendido. Depois desse pé na porta, a gente pode até acalmar os ânimos e entrar em uma conversa mais calma. Mas tem que ser feito e visto desta maneira. Nós, mulheres, juntas somos mais fortes, e isso é inegável. Isso tem que ser falado como um mantra até todo mundo entender que o que a gente busca são direitos iguais, não ser melhor ou pior que o homem. Acho muito importante e fico muito feliz de ver que essa competição, que foi introduzida dentro da gente (está perdendo espaço). Posso falar pelo meu meio, que isso foi introduzido desde pequena com quem começou a trabalhar cedo. (A ideia de) competição, de ego, de que as mulheres competem entre elas pelo olhar do cara, para chamar a atenção. Crescemos assim, foi feito dessa maneira. E ver que isso está se transformando, que a gente pode contar umas com as outras, e que eu sempre devo e vou ficar feliz que uma amiga conquistou um papel para o qual não passei... Esse tipo de competição não tem que ser enaltecida. Ver que isso está mudando é um suspiro, que a gente não tem que competir. É uma energia tão à toa que a gente gasta e que poderíamos estar focando em outra coisa... E é isso que está acontecendo agora. A energia está sendo colocada para o lado certo. Me dá um orgulho danado!
Você, aliás, fala de questões que geram debate, como o feminismo, de um jeito muito tranquilo nas suas redes sociais.
Tenho muita consciência de que a gente precisa conseguir tocar todas as pessoas. Estamos falando de um Brasil com classes sociais diferentes, onde, infelizmente, as pessoas não têm as mesmas oportunidades. O que me interessa, nas minhas redes, é entrar em contato com todas as pessoas. É, de alguma maneira, plantar sementinhas de conversas, de discussões, onde alguém leia algo que eu poste neste sentido, de consumo consciente ou feminismo, e vá refletir. Nada melhor do que fazer isso, principalmente nas redes, de uma maneira leve e de fácil compreensão.
Neste ano, você estreou a primeira temporada de Missão Design. Como foi comandar um reality de competição?
Foi o máximo! Decoração sempre foi um assunto que me interessou, por mais que eu não seja uma expert na área. E não tem como não se envolver quando você está testemunhando aquela competição. Você acaba torcendo, quer que todo mundo se dê bem. Era muito difícil para mim falar quem tinha perdido e ganhado. A gente passava o dia inteiro com aquelas pessoas, então era impossível não se envolver. Isso é bom, porque, como tudo o que faço apresentando, fui eu mesma. Tem aquela pitadinha de humor, de acidez. Tem muito a Fernanda ali no tempero do programa. E, claro, continuar com o tema do Desengaveta, consumo consciente, e fazer com que as pessoas reflitam e tenham essa vontade de ressignificar as coisas. (Fazer com que as pessoas entendam) que se algo quebrou, não tem necessariamente que jogar fora. Transformar, de uma maneira leve, natural e, principalmente, orgânica, a cabeça de quem está assistindo. É para isso que o trabalho vale a pena. Não é somente entretenimento, é entretenimento com propósito. Na vida, o que a gente tem que ter é propósito.
Que impacto um programa como o Desengaveta pode ter no público em prol do consumo consciente?
O público do Desengaveta é maravilhoso, superfiel, e completamente diferente. Outro dia, fui parada por um casal de senhores na rua. A senhora me disse: “Você precisa ir lá em casa desengavetar! Estou cheia de coisas, mas você já me convenceu de que eu preciso me desfazer de algumas” (risos). É isso que acontece com quem assiste ao programa, independentemente da idade. Elas ficam muito animadas, querem fazer o mesmo em casa. O programa segue na mesma linha, comigo indo à casa dos famosos para desengavetar. E tem os quadros, como o “do it yourself” ou o “uma peça, cinco looks”, para incentivar a repetição de roupas. Principalmente nessa era de look do dia, tem meninas muito novas achando que precisam comprar um monte de roupa porque não podem repetir na internet. A gente quer provar o contrário. O que podem esperar são convidados incríveis e muito generosos. Na primeira temporada, as pessoas desengavetavam de 30 a 50 peças. Na segunda, de 80 a cem peças. Nesta, estão passando de cem peças em todos os programas. Nas duas primeiras temporadas, ajudamos o INCAvoluntário, com 55 mil na primeira e 90 mil na segunda, e nesta vamos ajudar o Criança Esperança.
A sustentabilidade virou uma bandeira sua. Como você percebe o movimento?
As pessoas acham que consumo consciente é um bicho de sete cabeças. Mas a melhor coisa que a gente pode fazer pelo nosso planeta é consumir de maneira consciente. Consumir a gente vai, isso é fato, precisamos para poder viver. As pessoas acham que defendendo bandeiras como essa você vai virar um ecochato, ou não conseguir se inserir na sociedade. Durante muito tempo, o ter virou uma maneira de você ser aceito socialmente. Usar uma roupa de marca fazia com que você se diferenciasse. Hoje, vejo que as novas gerações estão mais preocupadas com o que está dentro delas e com o que elas podem deixar e fazer pelo mundo. Por isso, a garotada me interessa muito: eles já nascem de um jeito diferente.
Como esse tema se reflete na sua sua relação com a moda hoje?
Moda é a área em que não sou ansiosa na minha vida – porque em tudo eu sou um pouco ansiosa. Sabe aquele papo de :”Ai, você viu que lançaram isso? Eu quero ter”. Não tenho mais o “tem que ter” da moda. É o meu relacionamento mais saudável (risos). É leve, gosto de me vestir de uma maneira em que esteja passando alguma mensagem de quem eu sou. Gosto de brincar com a moda, e aí entra essa leveza também. Sou artista, frequentamos eventos, apresento programas no GNT, os ao vivos, e para isso tudo tenho um stylist que cuida de mim. O lado bom é que a gente usa a peça e depois devolve. Não sou aquela pessoa que o stylist me mostra uma peça, e eu quero comprar para ter. Não tenho a necessidade de ter tudo. O que eu compro hoje em dia é muito bem pensado. Sempre me pergunto muito antes de comprar uma peça. Quero que essa peça realmente tenha um valor dentro do meu guarda-roupa, independentemente do preço dela. Às vezes, é mais cara justamente porque vai ter uma durabilidade e porque a cadeia (produtiva) é (feita) de uma maneira correta, desde o algodão da plantação até chegar à prateleira, todo mundo foi bem pago. Isso conta e está no valor final da peça. Mais do que tendências, prezo por peças atemporais, que vou usar muito, brechós e por aí vai. Não que eu não use tendências, mas hoje prezo menos por ela. (Priorizo) quem sou eu vestindo, se está passando quem eu sou.
Você é vista como a amigona da galera. No seu Instagram, não faltam fotos de momentos divertidos com seus amigos, inclusive famosos. Parece que todo mundo quer ser seu amigo, não é?
É engraçado porque ouço muito isso das pessoas. Até nos comentários do Instagram, há muitas mensagens dizendo: “Quero ser amiga da Fê Paes Leme. Você é uma ótima amiga”. Fico muito feliz com isso. É muito bom as pessoas quererem ser suas amigas. Significa que você é uma pessoa legal, que está indo pelo caminho certo e que tem a acrescentar para o outro. Mas é claro que os olhos de quem vê de fora são diferentes. Não sou uma pessoa de tantos amigos quanto se imagina. Tenho muitos colegas, pessoas que eu adoro, com quem convivo profissionalmente. E os amigos da “bola de dentro”, como costumo dizer, que são as pessoas que convivem comigo. Como cresci no meio e tenho 20 anos de carreira, acaba que alguns amigos são pessoas famosas, mas não significa que seja amiga de falar todos os dias. Mas é muito bom ter esse lado, das pessoas quererem ser minhas amigas.
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