SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - "Oi filho!! Como você está? Que saudades. Esta semana não recebi nenhuma carta, você não me escreveu? Estou preocupada com você, me mande notícias, por favor. Quinta-feira mandamos três cartas para você: eu, seu pai e seu irmão. Você recebeu? Está precisando de algo? Se tiver, me fale que mando para você", escreveu dona Genilda a Felipe.
A resposta logo viria: "Oi, mãe! Tudo bem com vocês? Eu estou bem, graças a Deus! Eu recebi as cartas de vocês sim! Eu respondi via Correio, acho que por isso não receberam ainda. Eu amei as cartas, e saibam que estou muito orgulhosos de vocês por estarem firmes e fortes aí fora!". O rapaz encerra com "eu amo muito vocês".
Era tudo que dona Genilda queria ouvir. O canal de cartas virtuais entre pessoas encarceradas no sistema prisional e seus familiares foi criado pelo governo paulista para amenizar a angústia em um momento em que visitas, por causa da pandemia do novo coronavírus, estão suspensas. Felipe é um detento que aguarda julgamento em Jundiaí, onde fica uma das 176 unidades prisionais do estado.
"Foi uma forma que a gente encontrou para manter a comunicação dos reeducandos e familiares, para que não perdessem os laços afetivos", diz Carolina Maracajá, diretora do Departamento de Atenção ao Egresso e Família. "O contato da família, o apoio, o vínculo afetivo com familiares, é muito importante no processo de reintegração, para melhora dele como indivíduo."
A diretora aponta que a carta virtual agilizou um contato que os protocolos de saúde haviam tornado mais lentos. "Além do problema dos Correios, de demorar, quando a carta física chega à unidade, ela precisa passar pelo processo desinfecção. Ela precisa ficar lá parada, por três dias, para só depois se repassada ao reeducando."
A ferramenta foi disponibilizada em 26 de junho no site da Secretaria de Estado da Administração Penitenciária e faz parte do programa chamado Conexão Familiar. A procura pelo serviço surpreendeu até os mais otimistas e chegou a derrubar o portal do governo paulista no primeiro dia.
Em pouco mais de um mês, foram 546.461 correspondências virtuais --11 por minuto. "Foi bem aceito. Em uma hora o sistema caiu. Fomos atualizando, e, agora, está fluindo superbem", disse Carolina.
Para não colapsar todo o sistema, o governo impôs algumas regras: cada preso tem direito a receber apenas duas mensagens por semana e deve devolver a resposta à família em até cinco dias. Há um limite de 2.000 caracteres para carta virtual.
Isso viabiliza uma logística que começa com o recebimento da mensagem pelo setor checagem da unidade, que lê as cartas para evitar eventuais práticas criminosas, como fazia com a correspondência física. Impressa em papel sulfite, a carta é encaminhada ao detento ou detenta.
A resposta deve ser dada pelo preso a caneta no verso da mesma folha, para em seguida ser digitalizada e enviada por e-mail ao familiar. Só podem enviar mensagens pessoas que estejam no rol de visitas cadastrado na unidade.
O serviço, a princípio, deve ser mantido apenas durante a quarentena sanitária, mas a diretora afirma que a decisão final virá após avaliação da experiência, no fim do processo.